quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Nando Reis - Ainda não passou




Seguro os suspiros para não chorar. As lágrimas são diamantes por demais valiosos para serem perdidos em sentimentos repetidos. Mas como pesam em valor e forte desejo de reagir, liberto-as no papel. Eis o que lhe ofereço: lágrimas de tinta. Nossa história pesa sobre meu peito, mal escrita e mal lembrada, pois que meus capítulos não correspondem com o desfecho (ainda não bem fechado, devo dizer), e o texto está perdendo a cor, manchado por entre dúvidas e frustrações. Como entender essa mudança repentina, re-edição de verdades, sons alterados mal traduzidos? Principalmente se nem o próprio (con)texto parece se entender. 
É uma pena essa nova versão, sem coesão nem doçura, sem uma linha de romantismo, que não vai nem volta e parece não ter volta (gostaria que tivesse, e como isso me entristesse!). Há tanto a ser dito que as páginas se grudam na vontade de dizer tudo ao mesmo tempo: gosto tanto, sinto tanto, forte necessidade de admitir a perda, aceitar possibilidades, rezar por realidades alternativas, gritar incontrolavelmente por mais uma explicação! Não me aguento na minha paixão e nessa terrível vontade de fugir, destruir, odiar muito essa paixão. Choro com descrições órfãs, perdidas, vagando na mente e no sentimento, muito o apertando e torturando, pressionando para confessar a importância do meu intento, coragem de me tornar vulnerável, pronunciar suspiros e articular insatisfações.
Devo fazer-me peça, declamar em verso e poesia os anseios indescritíveis da alma; derramar em longo monólogo rios entrecortados, Ofélia afogada na sua própria decepção. É preciso cenas e marcações, representação autêntica do drama em que nos encontramos, largado ao chão em folhas soltas numa ordem caótica de reestruturação de ideias. Me lanço sob a luz e, banhada de inspiração, crio momentos intermináveis e recomeço o meu argumento:
Não se encante com o estilo ou com a intensidade com que me espresso - seu drama é falho e confuso, necessita que eu lhe acrescente ao menos um fim merecedor de cortinas (cortinas de lágrimas, véus de tristeza, resolução decepcionada sem vontade de se reapresentar). Você fez-me força, fez-me felicidade e confiança, fez-me sua em personagem, autora e atriz, de maneira que sonhos foram palpáveis e dias foram oníricos. Sorrisos incontroláveis de admiração, olhares roubados no calor de cada encontro. Mas não me ame por isso, mesmo que tenha te amado. Não lhe peço tanto, não lhe exijo força. A mim cabe todos os papéis; vestida de personagem me livro do querer (se assim você o quiser), técnica bem maestrada, facilmente acionada. Exijo compromisso ou comprometimento, não exijo mais que o que tínhamos antes: cenas de diálogo e interação, iluminação de seus olhos e acolhimento de seus braços. Sem isso não há como prosseguir. E dispenso descrições de tristeza, apago do vocabulário dores e privações, questiono sua existência e, se preciso for, substituo-lhe por idealização sem que a obra em nada se prejudique. 
Já leu minhas lágrimas? Represento-as em insensatez, castelo de areia na tempestade, golpe de sorte nas mãos do azar, destino desnorteado deslizando em direção ao abismo. Suas falas traçam caminhos desencontrantes, mas se quiser pôr seus passos junto aos meus basta que abraçes nossa história original e recolha minhas lágrimas, não as oferecendo a mais ninguém.
Meu coração me dói com tanta dúvida, tantas voltas no medo da sinceridade. Sua cortante sinceridade, minha admitida sinceridade, confiança exarcebada no futuro inexistente. Por esse motivo me vejo infindável e perdidamente abandonada, criança amedrontada, e vejo com cada vez mais lágrimas nos olhos que muito digo porque o sonho se esvaziou e não há mais uma gota de beleza por que lutar. E, nessa desistência, só tenho como chorar e com as lágrimas se vai o meu intento de contê-las, e as palavras por quais fugiam. Guarde essa confissão porque já tenho muito peso a carregar. Eis o que me sobra: lágrimas de dor.
 




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